Sunday, March 19, 2006




"não trago nada.
não sou nenhum oceano,
não venho para te afogar

O Sol esvai-se em vento.
A areia caminha sem praia
e cada grão se faz lua
na tua cara que me olha e me busca,
demasiado nua.

Eu sou o tirlho por onde sulcas.
Eu não sou nada que não esperasses.
Tudo o que a minha mão te estende,
estava escrito na tua endoderme,
no calor das tuas pernas,
nos passos infatigáveis
dos teus segundos fátuos.

Não trago nada.
Sou só agua.
Venho para te afogar."

Manuel Cintra in "Não Sei Nunca Por Onde"
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Parque grande de Zaragoza!Estava um lindo entardecer! vamos la a ver se me veem fazer uma visita pessoal! Aqui tou � espera!!:P:P

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Algo

As luzes quase que cegavam, eram fortes como ela não podia ser.
Levantava-se e voltava a sentarse. Custava-lhe andar direita no meio daquela gente. Os corpos roçavam uns nos outros, impedindo-lhe a passagem. No fundo não sabia se amava ou odiava aquele sítio. Tinha um interesse estranho por ele, despertava-lhe uma curiosidade para coisas que ela nunca julgou vir a entender e menos gostar.
Numa tentativa de erguer o seu corpo, buscava sair de ali, alcançar a porta de saída. Ao fundo podia ler em luz verde "Exit", mas nao tinha forças, algo nela a impedia de respirar e andar, uma angustia apoderava-se do seu corpo. Débil e medricas continuava a andar, não sabia bem porquê o fazia.

Chegou a casa. Deitou-se na cama que não estava feita; nunca o estava. Encolheu-se e olhou para o lado. Ali estava ela. Porquê? Era como uma perseguição, uma assombração.
Muitas vezes os dois corpos confundiam-se. E então era aí que ela deixava de saber se era ela ou se era a outra. Mesmo quando não estavam juntas, ela olhava-se no espelho e não se reconhecia. Ficava (ou ficavam??) assim horas em frente do espelho, e repetia "nao sou eu, nao sou eu"; era então que aparecia o homenzinho da picareta. Era muito pequeno, como um duende, subia desde o chao até ao peito dela, e mesmo na zona da boca do estomago começava a escavar, a picar, mais fundo, mais fundo, "nao sou eu, nao sou eu, nao sou eu".

Voltava. Era de noite. Entrava naquele antro escuro e ruidoso. As luzes voltavam a cegá-la, apontando na sua direcção e ela voltava a deixar de ser ela. Esquecia o seu corpo por momentos, abandonava-o e deixava-o á deriva. Não eram eles que a olhavam. Era ela. Fazia tudo por ela.
Só a recompensa a acalmava. O calor que lhe subia pelas veias até à cabeça, fazia-a dançar sem parar, era perfeita, sem erros, sem vergonhas. Feliz.


Muitas vezes pensou em parar, em deixar de usar aquela máscara suja e negra no negro da noite. Muitas vezes pensou eu sair daquele sitio, em mudar de vida, ser alguêm, ser feliz de verdade...muitas vezes pensou..."não sou eu,...não sou eu!"